Tarde que não findava... Lá estava minha mãe
pilando o arroz no terreiro, mais precisamente na frente da casa. Estava na
posição que ficava de lado para a ladeira, que por sinal, marcou a vida de
todos daquele seringal: o Seringal Esperança, situado em Xapuri, no Acre. O
Esperança era o único lugar que minhas três irmãs e eu conhecíamos. Não tinha
mundo mais belo do que aquele. A mata rodeava o terreiro. Até se ouvia a onça
avisar que estava perto. No silêncio da noite, amedrontava os bichos, a gente.
A casa coberta de palha com o jirau pendurado nas paredes de ‘paxiuba’, as
galinhas ao redor completavam a paisagem fantástica do meu lugar.
Amanhecia, entardecia, anoitecia e a ladeira
continuava ali. Que ladeira aquela! Tão inclinada! E a castanheira? A árvore
imponente da Amazônia, situada em seu topo, completava sua beleza. Lembro que
quando os cachorros latiam, todos olhavam para a ladeira. Era sinal de visita
chegando. Sempre que podia,ficava sentada na varanda admirando-a, na
expectativa de alguém chegar. Era apaixonada pela ladeira. “Ai, que saudades de
subir e descer a ladeira!”Mas, voltando àquela tarde que não teve fim, recordo
que minha mãe soltou bruscamente o pilão, fixou o olhar rumo à ladeira. Eu, que
estava na varanda como de costume, gritei que alguém descia.
Uma senhora vistosa e um rapaz com feição diferente da nossa raça desciam
silenciosamente. Minha mãe correu. Era uma pressa que nunca a vi ter. Fiquei intrigada. Muitas pessoas já tinham
descido e subido aquela ladeira enorme e minha mãe continuava tranquila. No
entanto, naquela tarde foi diferente. Ela gritava: mamãe! Mamãe! Minha mãe
parecia ser uma menina pedindo proteção. O abraço não terminava. As lágrimas
não cessavam.
A tarde continuava e o abraço em frente à ladeira
também. Minhas irmãs e eu não entendíamos nada. A senhora também nos abraçou,
todavia não sabíamos o motivo de tal ação. Só dizia que era nossa avó. Não
sabíamos nada a respeito. Ainda continuava sendo uma estranha.
A tarde não terminava. Era conversa que não
tinha fim. Escutei palavras que nunca ouvira: avó, avô, tia, tio, primas,
primos... Eram estranhos para mim, já que só existiam meus pais, minhas irmãs e
alguns conhecidos da colocação.
Uma das falas de minha avó, no diálogo com
meus pais chamou-me a atenção. “Ah, lá vocês terão vida melhor.”Insistia “
Minhas netas vão estudar!”
No caminho do igarapé.Aliás resplandecente ,
suave aos pés por ser coberto de folhas marrons, verdes, amarelas – divertidas-, minha então avó me acompanhava. Fazia-me
perguntas sobre o meu mundo. Eu, balançando as panelas, suadas da frescura de
água natural, respondia cantarolando.
Como não gostar desse lugar de alegria, de pureza da floresta, encantos e
soberania?
Na manhã seguinte aquela tarde continuava...
Corre para lá, corre para cá!. Eu só sabia que devia obedecer. Ajudei minha mãe
a arrumar as malas. Quando dei por mim, estávamos subindo a ladeira. Lá do topo
avistei o lugar que tanto amava. Tão sublime! Mal sabia que aquele seria meu
último olhar a ele. Apenas fui. A ladeira não podia ir. Lá mesmo permaneceu. A
viagem seria longa. Parti sem saber para onde ia. Parti sem saber exatamente o
que sentia. Fui com o olhar a gotejar: lagrimava como um rio cheio.
Aluna:Juliana Mariano (8º C) 2014.
Professora: Francisca Freitas S
Pinheiro. / Escola Edison Façanha. 2014(
Entrevista feita com Francisca Freitas – 30 anos)
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